READY TO GO! INTERNACIONAL: Diálogo Social em tempos de Covid-19 ENTREVISTA: Rui Marçal SKYBRARY: Risco das Baterias de Lítio LADO TÉCNICO: 5G: Transmitting blind POR CÁ: A Metamorfose do Aeroporto de Lisboa Nova Sala de Operações no Centro de Controlo de Lisboa DESTINO: Dubai REVISTA APCTA.VOL4 #59. ABR22
TEMAS / PESSOAS / LOCAIS CONTRIBUA COM IDEIAS E SUGESTÕES PARA: flightlevel@sincta.pt Flight Level Revista da APCTA Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo Presidente do SINCTA: Carlos Valdrez Presidente da APCTA: Ana Santiago Directora: Andreia Lopes Coordenação Editorial: Pedro Matos Colaboradores: Luís Tojais, José Matos, Miguel Dias, Natacha Pinho, Nuno Chambel, Patrícia Gera, Pedro Loureiro, Ricardo Abreu, Tiago Canto Correspondentes: Delegações da APCTA Propriedade: APCTA – Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo Rua de Matola 4 – 1800-270 Lisboa Distribuição: Gratuita aos Sócios Design gráfico: FPreto – graphic design for closed and open media Impressão: Europress - Indústria Gráfica Periodicidade: Trimestral Tiragem: 600 exemplares Lisboa, Abril de 2022 SUMÁRIO 02 Internacional: Diálogo Social em tempos de Covid-19 06 Entrevista: Rui Marçal 12 Skybrary: Risco das Baterias de Lítio 16 Por cá: A Metamorfose do Aeroporto de Lisboa 18 Por cá: Nova Sala de Operações no Centro de Controlo de Lisboa 20 Lado Técnico: 5G: Transmitting blind 24 Destino: Dubai 28 Ecos da Imprensa: Uma seleção de interesse ATC 30 Até Breve: Carlos Gama da Silva / José Ornelas Pereira 32 Breves: Slava Ukraini / Solidariedade entre CTA Europeu 34 Breves: GFL 2022 – La Thuile 36 Rubrica Literária: “Último Olhar” de Miguel Sousa Tavares
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.1 EDITORIAL Carlos Valdrez Presidente do SINCTA Vivemos circunstâncias extremamente difíceis e voláteis, exponenciadas pela invasão da Ucrânia por parte da Rússia, que veio criar um gravíssimo problema humanitário. SINCTA e APCTA têm promovido a ajuda ao povo Ucraniano e, particularmente, às famílias dos nossos colegas CTA. Continuaremos atentos a esta crise que já desalojou milhões de cidadãos europeus, desejando que a barbárie termine o quanto antes. No nosso país, tomou posse o XXIII Governo Constitucional. Nos ministérios com as tutelas financeira e sectorial da NAV Portugal houve algumas surpresas. No Ministério das Finanças, além do novo Ministro, há também uma nova Secretária de Estado do Orçamento e um novo Secretário de Estado do Tesouro, oriundo da extinta Secretaria de Estado das Finanças. Por outro lado, no Ministério das Infraestruturas e Habitação há mais estabilidade: além de se manter o Ministro, releva-se apenas a passagem do anterior Secretário de Estado Adjunto e das Comunicações para a Secretaria de Estado das Infraestruturas. Este novo governo tem sérios desafios pela frente e não poderá descurar a situação do prestador de serviços de navegação aérea (ANSP) nacional. Por um lado, tem de nomear um novo Conselho de Administração, por outro, garantir que a frágil situação financeira se mantém sobre controlo. Urge também aplicar o Regulamento Europeu que determina o ressarcimento, por parte do Estado, dos voos isentos. Esta dívida já foi reconhecida na legislatura anterior, no entanto, a tutela financeira não tomou diligências no sentido de resolver esta situação, que se arrasta desde 2007... No âmbito europeu, os ANSP aguardam a aprovação da revisão dos planos de desempenho. O Órgão de Análise do Desempenho (PRB) já enviou as suas recomendações à Comissão Europeia, dando parecer positivo a 17 planos nacionais e aconselhando a revisão de outros 7 (um destes representa um bloco funcional de espaço aéreo, do qual fazem parte 6 países). Apesar de tudo, a esmagadora maioria dos pareceres positivos apresentam algumas ressalvas que deverão implicar uma monitorização por parte do PRB. Importa sublinhar que estes planos foram elaborados de acordo com as previsões de tráfego publicadas pela STATFOR (Eurocontrol) em Outubro, no entanto a volatilidade dos últimos 2 anos mantém-se, quer pela incerteza associada à pandemia, quer pela guerra que assola o leste europeu. O alcance desta guerra ultrapassa todas as fronteiras. Para além de terem sido cancelados inúmeros voos comerciais, existe um volume significativo de espaço aéreo encerrado à aviação civil e sérias limitações associadas à maior utilização de áreas militares. Do ponto de vista operacional, existe uma degradação dos sistemas de navegação e de vigilância baseados em satélite nas regiões do Mar Báltico, leste da Finlândia, Mar Negro e leste do Mediterrâneo. Todos estes factores têm contribuído para cancelamentos, atrasos e alterações aos fluxos. Isto significa que o trabalho dos ANSP se encontra cada vez mais dificultado e, se o preço dos combustíveis mantiver a sua tendência de aumento, poderemos vir a ser confrontados com uma inversão da procura! A instabilidade reina e, portanto, a capacidade de adaptação continua a desempenhar um papel vital na forma como abordamos esta realidade.
p.2 Diálogo Social em tempos de Covid-19 Internacional Miguel Dias Nos anos anteriores a 2020 observou-se na esfera de decisão central umaumento da atenção dedicada à dimensão social das relações laborais na Europa. No sector ATM em especial, a concertação entre empregadores e empregados dava sinais de estabilização face aos desafios domomento, como os Planos de Performance e Desempenho e o aumento significativo do tráfego. Terá sido a Covid-19 umdesafio demasiado grande para as relações mais frágeis no Céu Único Europeu? Os Princípios que até janeiro de 2020 se diziam fundamentais Em novembro de 2017 a Comissão Europeia publicou o “European Pillar of Social Rights”, um documento com 20 recomendações (sem força legal vinculativa para os Estados-Membros), com a intenção de promover o renascimento da dimensão social da União Europeia, procurando o equilíbrio entre esta e a dimensão económica das políticas desenvolvidas no coração da Europa. Com 20 princípios básicos e considerados fundamentais, no oitavo a Comissão Europeia enaltece a importância dos parceiros sociais e enumera os direitos que lhes devem ser atribuídos (nomeadamente os da negociação coletiva e do direito à greve). Para além disso, observa que os parceiros sociais devem ser informados e consultados em relação a assuntos para eles relevantes.
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.3 Antes disso, em março de 2016, já ATCEUC, ETF e CANSO tinham criado o documento “Toolbox for Successful Social Dialogue in Air Traffic Management”, onde se acertavam princípios e procedimentos desenhados à medida das especificidades do sector ATM, e que manteriam a relação entre os ANSP e os seus profissionais numa base saudável e bem-sucedida. Para o propósito deste artigo, destaca-se a seguinte frase desse documento: “No matter how many measures or procedures you create for trustworthy social dialogue, you will fail if the two parties do not understand or respect each other.” Não entre em pânico. Não entre em pânico. NÃO ENTRE EM PÂNICO! Infelizmente, com o impacto conhecido da Covid-19 no sector ATM, não é correto afirmar que os princípios base do diálogo social se mantiveram intactos em toda a Europa. Na verdade, acreditamos agora que em alguns casos eles nunca foram verdadeiramente compreendidos e aceites por alguns parceiros do sector. Nos tempos em que a resposta ao crescente tráfego necessitava da colaboração da força laboral, alguns empregadores apresentaram uma maior abertura para ouvir as preocupações de sindicatos e associações profissionais do que aquela que acabaram por demonstrar quando a maior redução de tráfego da história trouxe consigo também a maior crise de receitas deste sector infraestrutural europeu. Perante um cenário incerto e instável, terão todos os ANSP respeitado os princípios defendidos pela Comissão Europeia ou a famosa caixa de ferramentas que manteria o diálogo social saudável? Polónia: Dividir e conquistar, em nome da carreira pessoal Já no final de 2019, o atual CEO da PANSA (ANSP polaco) tinha dado sinais de pouca cultura de diálogo social: em plena negociação do Acordo Coletivo de Trabalho, terão sido feitas alterações às condições laborais pela empresa de forma unilateral e contra a vontade dos parceiros sociais. A crise pandémica acabou a ser usada pela PANSA como a desculpa perfeita para implementar uma série de medidas, que anteriormente tinham sido barradas em sede negocial por alguns Sindicatos e até pelo departamento de segurança da própria empresa, entre as quais se destaca a implementação do conceito de SPO (“single person operations”) nos diferentes Órgãos de Controlo. Com incidentes operacionais e diplomáticos pelo meio, a PANSA acabaria por deixar de reconhecer a legitimidade do Sindicato mais representativo dos CTA, retirando-o da mesa de negociações e despedindo os membros mais ativos da sua
p.4 Direção. Pelo meio, a empresa foi validando alterações às condições laborais do staff operacional (nomeadamente CTA) em processos de negociação coletiva cuja representação era convenientemente enviesada para, assim, obter a aprovação por parte de outros Sindicatos afetos à empresa que não representavam efetivamente o seu staff operacional. No final de 2021, com os associados do Sindicato agora não-reconhecido pela empresa a recusarem a proposta de novo Acordo Coletivo de Trabalho, a PANSA instaurou um processo de despedimento de staff operacional, respectivamente 81% e 86% dos CTA do APP e do ACC de Varsóvia. Naturalmente, os atrasos previstos para o Verão IATA de 2022 são de uma escala nunca antes vista. No entanto… O CEO da PANSA acabou por levar até ao fim o seu mandato enquanto Presidente da “A6 Alliance” (uma aliança de ANSP Europeus em prol da modernização do sistema ATM), sem ter sido contestado por nenhum outro ANSP que, tal como a PANSA, deveria alinhar-se no espírito de diálogo social da Comissão Europeia e da CANSO. Croácia: Negociar ou castigar? Na Croácia, a negociação do Acordo Coletivo de Trabalho de 2019 (assinado em dezembro desse ano) não foi fácil perante os desafios então existentes, tendo o Sindicato local marcado uma posição forte que terá gerado na Administração da Croatia Control alguns anticorpos. Perante a crise pandémica, a negociação do corte de salários dos CTA croatas demoraria mais de meio ano, tendo ocorrido ao longo do processo várias ameaças de despedimentos. Mas não só: com a reforma antecipada de CTA, a empresa decidiu unilateralmente que as funções de FMP seriam acumuladas pela Supervisão, sem providenciar a estes profissionais a devida formação para o desempenho das suas novas funções. Com o Sindicato Croata a manter-se firme na defesa da sua classe, a Croatia Control passou a usar armas mais impróprias: pegando na recusa do Presidente do Sindicato Croata em desempenhar as funções de FMP por não ter formação, iniciaria contra ele um processo de despedimento (que, à luz da lei Croata, necessita de aval por parte do próprio Sindicato) e declará-lo-ia temporariamente incapacitado para desempenhar as funções de CTA. Assim, o ataque da Croatia Control passou a ser direcionado para o líder da Classe que, com base na união solidária da mesma, foi vencendo as pequenas batalhas diárias na defesa dos direitos laborais, batalhas essas que continuam nestes dias, com processos legais entre a empresa e o Presidente do Sindicato Croata a correr em tribunal.
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.5 Perante crises, relembrar as bases di·á·lo·go (latim dialogus, -i) nome masculino (...) 3. Discussão ou negociação entre duas ou mais partes, geralmente com vista a um acordo. (fonte: priberam.pt) As incertezas que surgiram com a maior crise da história da aviação mundial fizeram tremer muitos profissionais e instituições do nosso sector. Companhias aéreas, aeroportos, ANSP e outros prestadores de serviços enfrentaram a maior redução de tráfego de sempre, que os deixou numa crise de receitas sem precedentes. É nestes tempos de maior pressão que cada um de nós, individual e coletivamente, demonstra os seus reais valores. Felizmente, na maioria dos ANSP europeus, a definição de “diálogo” manteve-se viva e saudável, com acordos definidos e firmados em conjunto entre empregadores e empregados. Podíamos escrever um outro artigo, felizmente mais extenso, relatando as diversas abordagens tomadas na maioria dos Estados Europeus que permitiram aos ANSP e aos seus profissionais atenuarem o mais possível o impacto causado pela atual crise. No entanto, os casos críticos da Polónia e da Croácia, no seio de uma União Europeia que se procura consciencializar cada vez mais para a dimensão social, são um alerta vermelho que importa não escamotear. Há que não esquecer que, dialogando, a resposta aos maiores problemas que o sector enfrenta cria-se em conjunto, com empregadores e empregados em constante partilha de informação. Mantendo esse princípio vivo, todos os desafios serão vencidos. .
p.6 Entrevista Andreia Lopes Fotos: Nuno Chambel Rui Marçal TWRCAS
p.7 REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo Antes de ingressares na carreira de Controlador de Tráfego Aéreo, exploraste outras áreas. Queres partilhar connosco esse teu percurso anterior à NAV e o que te motivou a concorrer ao curso ab-início? Antes de entrar para a NAV licenciei-me em Arquitetura e entrei para a Ordem dos Arquitetos, e tenho desempenhando esse ofício nos últimos 20 anos, nunca deixei de exercer arquitetura. Concorri para a NAV porque tinha (tenho) um amigo CTA (Nuno Chambel) que me avisou que iria haver concurso. Concorri, fui selecionado e integrei o famoso FI.001. Em 2006 acabaste a formação inicial CTA e foste colocado em Santa Maria. Já nessa altura mostraste uma grande variedade de interesses, desdobrando-te entre o trabalho na NAV e outras atividades de carácter voluntário, e foi também em Santa Maria que iniciaste a tua colaboração com o SINCTA. Como é que relembras esses tempos e qual o segredo para desenvolveres múltiplas atividades ao mesmo tempo? Sempre fui muito dinâmico e considero que devo ter um papel ativo na minha sociedade. Em Santa Maria era CTA, Arquiteto, Treinador de Voleibol e Dirigente Sindical do SINCTA. Hoje recordo esse tempo com saudade e só me arrependo de não ter ficado em Santa Maria mais tempo. Integraste várias direções do SINCTA. Como vês o papel que o SINCTA e a APCTA representam para a classe? Com o sector a exigir cada vez maiores níveis de produtividade, o âmbito dos assuntos que estas instituições têm que acompanhar torna-se mais abrangente? Integrei seis mandatos de direções do SINCTA, posso dizer que conheço bem aquela casa. Considero vital o papel das duas instituições na missão de manter a nossa classe num patamar de excelência a nível nacional. Não tenho ilusões, as classes profissionais que não são devidamente representadas pelas suas instituições mais cedo ou mais tarde perdem o seu enquadramento político. O sindicalismo de hoje transformou-se numa mediação política. Ser capaz de perceber isso e adaptar as mentalidades à realidade tem sido o que tem permitido à nossa classe manter o equilíbrio social. Deveremos continuar a ser abrangentes, moderados e inovadores. A revista Flight Level deslocou-se à Torre de Controlo de Cascais para entrevistar o novo Chefe TWRCAS, Rui Marçal. Comum início profissional emSanta Maria e a consolidação de carreira no CONLIS, optou por uma transferência para Cascais para abraçar umnovo projeto. A Flight Level procurou conhecer este percurso profissional.
p.8 Quer o SINCTA quer a APCTA dependem do espírito associativo e voluntário dos diversos membros que vão integrando as direções e delegações. Qual o contributo desta experiência, para a formação pessoal/profissional dos CTA? Voluntariei-me para doze anos de direções do SINCTA, em que trabalhei com três presidentes do SINCTA e com três presidentes da APCTA. Vejo o meu contributo como uma enorme experiência pessoal, que me tornou num melhor CTA e num melhor colaborador da NAV. Tenho muito orgulho no meu percurso e nas pessoas que me lideraram. A melhor experiência que se ganha é conhecer a nossa empresa, perceber que existe vida para além de uma posição de controle, e saber que zelar pela saúde da NAV é zelar pela nossa saúde. Em 2009 foste transferido de Santa Maria para o CONLIS, mais concretamente para a Aproximação (APP) de Lisboa, onde permaneceste até 2019. Houve um crescimento enorme de tráfego nesse período, e estiveste envolvido em vários projetos de melhoria de procedimentos, sistema ATM e espaço aéreo. Como viste a evolução do APP de Lisboa durante este tempo? Quais as principais melhorias que identificas, para fazer face aos constrangimentos criados pelo aumento de tráfego? O APP passou por um período de crescimento de tráfego considerável na última década. As medidas que foram implementadas agregam a realidade da altura com as aberturas políticas que se iam tendo. As opções tomadas nunca são as evidentes, porque os fatores externos tomam uma importância relevante nas decisões, principalmente os custos dos recursos humanos. Mas, como sempre, quando nos dedicamos a uma causa conseguimos encontrar boas soluções, como por exemplo o desdobramento dos setores Aproximação (em aproximação e arrival - ARR) e Terminal (em Upper e Lower) ou a otimização de procedimentos STAR. É uma característica da nossa NAV, quando há vontade para resolver problemas, os problemas resolvem-se.
p.9 REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo Um dos projetos a que dedicaste mais energia foi o desenvolvimento do Point Merge System (PMS). Continuas a considerar a sua implementação como essencial para dar resposta ao aumento de tráfego no Sistema Aeroportuário de Lisboa (SAL)? Não só considero que é essencial como acho que foi um erro ter sido adiada a sua implementação. Teria sido o mais acertado, teríamos ultrapassado a pandemia já com o PMS implementado, e agora que o tráfego começa a recuperar, já teríamos dois anos de experiência nestes procedimentos. Infelizmente a opção tomada foi outra, mas tenho a esperança que as pessoas com o poder decisório não voltem a cometer o mesmo erro. De 2017 até à tua transferência para Cascais, foste Instrutor na Aproximação de Lisboa. Esta função enriqueceu a tua experiência profissional? Qual é o contributo mais importante que um instrutor pode deixar aos CTA em qualificação? Sempre fui da opinião que quemdeve falar da instrução são os instruendos. Temos instrutores na nossa carreira que se preocupam demasiado em falar e esquecem-se de ouvir. Os instruendos têm imenso para dizer, com eles evoluímos como controladores e crescemos como pessoas. Não há nada mais gratificante do que contribuir para o sucesso de um instruendo. Foi uma função que me preencheu bastante, pois, além do controlo de tráfego aéreo, um instrutor deve passar valores de classe, camaradagem, respeito e hierarquia. Ainda no CONLIS, desenvolveste interesse pela área dos fatores humanos, foste Par CISM e Facilitador TRM. Qual a relevância desta área para a nossa profissão? Uma classe solidária e atenta aos seus será mais forte. Devemos investir nos fatores humanos para não repetir erros de outros tempos e erros de outras classes profissionais. A essência da nossa profissão sempre foi a reação humana às várias etapas da vida da empresa. Há que potenciar esse enorme trunfo que temos. Em 2019 pediste transferência para a Torre de Cascais, para um novo projeto. O tipo de operação neste aeródromo é muito diferente das tuas experiências passadas e, num certo sentido, bastante peculiar. Quais as principais dificuldades que os CTA deste órgão enfrentam diariamente? Mais do que o tipo de operação ou a tipologia de tráfego, a verdadeira dificuldade de trabalhar neste órgão são as condições de trabalho e descanso. Para quem trabalhou nos dois Centros de Controlo da NAV, chegar a Cascais é um choque considerável. É um órgão que está completamente desenquadrado da realidade NAV: enquanto as torres da FIR de Lisboa falam em novas versões do TWRATM, Cascais ainda faz “à mão” fitas de sobrevoos e controla aeronaves não correlacionadas. Mas há neste órgão ummotivo de orgulho enorme, que são as pessoas que por cá estão e por cá passam. A quantidade de tráfego que se está a controlar em Cascais é histórica, e se juntarmos a ausência de ferramentas, rapidamente se percebe que tem sido à custa do esforço dos recursos humanos.
p.10 A proximidade do aeroporto de Lisboa é um constrangimento para esse tipo específico de atividade? Será que os níveis de instrução de pilotos em Cascais estão a atingir os limites a nível de capacidade/hora? O que pode ainda ser melhorado? Não considero que a proximidade de Lisboa seja um constrangimento, pelo contrário, é uma oportunidade. A mais valia de Cascais é precisamente a proximidade de Lisboa. Os limites a nível de capacidade só estão a ser atingidos por falta de iniciativa própria da NAV. No dia em que se quiser resolver esse problema, resolve-se, nunca existiu essa vontade, a não implementação do PMS é um bom exemplo das opções que se têm tomado. Enquanto Supervisor de Cascais deparaste-te com situações exigentes. Como encaras o papel do Supervisor no bem-estar da equipa? O papel de Supervisor é essencial para a proteção da nossa classe. A supervisão da nossa rotina operacional irá proteger- -nos de maus hábitos e comportamentos menos profissionais. Os supervisores têm uma função de muita responsabilidade e não a devem desempenhar por motivos errados. Relativamente à supervisão em Cascais, aqui existe um fator de dificuldade acrescido, os acidentes. Aqui gerimos vários acidentes por ano, todos nós que trabalhamos nesta torre já vivenciámos esse impacto algumas vezes, e marca-nos para a vida.
p.11 REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo Sendo a tua formação académica em arquitetura, acreditamos que o projeto de construção da nova Torre de Controlo seja algo que acarinhes em particular. Quais os principais benefícios que a construção da nova torre, em conjunto com as restantes obras no aeródromo, irão trazer para os utilizadores desta infraestrutura? Mais do que para os utilizadores, estes projetos são importantes para os CTA que aqui trabalham diariamente. É a eles que dedico o meu esforço. Nenhum CTA da NAV deveria trabalhar nestas condições, e enquanto tiver energia farei tudo para as melhorar. O projeto da nova torre foi um dos projetos que me motivou neste desafio, e neste momento é um passo essencial para a definição deste aeródromo. Com o projeto de reconversão do aeroporto do Montijo adiado, qual poderá ser o papel do aeródromo de Cascais, no aumento de capacidade do SAL? Só as pessoas menos atentas não reparam no aumento de capacidade que Cascais tem tido. Enquanto as pessoas olharem para Cascais como um problema não iremos evoluir. Cascais pode ser uma solução transitória importante, mas por falta de visão, já hoje estamos atrasados na implementação de estratégias estruturais entre aeroportos. O maior problema do SAL sempre foi a falta de visão futura de alguns decisores responsáveis, que optam constantemente pela manutenção e nunca pela alteração de mentalidades. Atualmente, como chefe da TWRCAS, quais consideras serem os principais desafios a curto e a médio prazo? O desafio principal é trazer a este órgão condições de trabalho e descanso iguais aos outros órgãos da NAV. As necessidades já foram amplamente divulgadas, agora necessitamos de ajuda e vontade para as conseguir implementar. Cascais é um aeródromo com imenso potencial para a nossa empresa, não só pela quantidade de tráfego que controla, mas principalmente pela sua localização estratégica. Como nota final, que mensagem gostarias de deixar aos colegas CTA? A melhor mensagem que eu poderia dar aos CTA fiz questão de a apresentar no fórum correto para esse efeito - ENCTA. Cascais teve um crescimento de tráfego impressionante desde maio de 2021 (pós pandemia), já batemos os valores hora e os valores mês várias vezes. Tem sido um ano incrível, mas que inevitavelmente terá de ser acompanhado com o respetivo desenvolvimento tecnológico. Cascais pode, e deve ser uma mais valia para o Sistema Aeroportuário de Lisboa, estamos prontos para fazer parte dessa estratégia e contribuir para o crescimento da nossa empresa. . “O papel de Supervisor é essencial para a proteção da nossa classe. A supervisão da nossa rotina operacional irá protegernos de maus hábitos e comportamentos menos profissionais. Os supervisores têm uma função de muita responsabilidade e não a devem desempenhar por motivos errados.”
p.12 Paralelamente ao artigo, Aircraft Fire Risk from Battery-powered Items Carried on Aircraft (https://skybrary.aero/articles/aircraft-fire-risk- -battery-powered-items-carried-aircraft), serve o presente para aumentar a consciencialização de alguns aspetos de segurança. Cerca de 2015, os tópicos seguintes emergem e levam à revisão ou criação de novas regras e recomendações de boas práticas a nível internacional: • “Bagagens inteligentes” • Baterias suplementares; • Power banks; • Trackers; • Etiquetas de bagagem eletrónicas; • Scooters elétricas; • E-cigarettes Duas características das baterias de lítio explicamo porquê de passageiros e carga deverem ser protegidos de perigos durante voos comerciais de transporte: as células nas baterias são passíveis de autoignição e de entraremnum estado de aumento exponencial de temperatura. Casos recentes de incidentes emaeronaves mostramque avanços tecnológicos e novos usos das baterias de lítio necessitamde uma monitorização contínua. Os profissionais da aviação, passageiros e stakeholders devem rever periodicamente os conhecimentos e ‘skills’ por forma a darem resposta aos riscos. RISCO DAS BATERIAS DE LÍTIO Skybrary Patrícia Gera
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.13 Tal como com gerações de baterias anteriores, PED (personnal electronic devices) e novos dispositivos tornaram essencial a aquisição de conhecimentos e treino, relativamente a elementos não familiares, por parte dos prestadores diretamente envolvidos nas operações de voo, particularmente o pessoal de cabine, sendo igualmente recomendado para quem tem responsabilidades indiretas. A abrangência da nova informação inclui: • regras de transporte; • conhecimento do power rating (Watt/hour) das baterias e power banks • manuseamento seguro de baterias; • carregamento e armazenamento; • tomada de conhecimento de regulações de segurança nacionais que proíbam power banks e baterias suplementares nas cabines das aeronaves; • prática de treino de métodos aprovados para o combate a incêndio na cabine originados por baterias de lítio. Mitigação de Riscos Mais de 20 anos de experiência mostram que a probabilidade de ocorrência de incêndios originados por baterias de lítio, especialmente durante operações de voo, continua significativamente baixa, mas com um potencial de severidade elevado. Quando se verifica um aumento exponencial da temperatura das baterias (thermal runaways), estas podem entrar em ignição e levar à combustão das baterias adjacentes, bem como dos materiais comburentes anexos. Os investigadores destes incidentes tipicamente concluem que, no pior cenário, o processo envolve chamas, fumo, vapores e explosões repetitivas com ejeção de gases quentes e metal derretido, podendo causar ferimentos graves e danos significativos. Thermal runaways sempre preocuparam os investigadores. Esta prolongada reação química pode ser originada por um curto-circuito, uso inapropriado das baterias, abuso físico do equipamento, falhas nos sistemas de proteção, defeitos de fabrico ou fontes térmicas externas. Historicamente, estes eventos provocam desorientação nos tripulantes de cabine e passageiros e podem tornar-se particularmente perigosos quando se propagam a zonas não acessíveis da aeronave. O cumprimento por parte dos fabricantes e utilizadores de todas as medidas de precaução, instruções de manuseamento e práticas de combate a incêndio continuam a ser determinantes na diminuição da probabilidade de incidentes graves. De acordo com um artigo publicado em 2016 pela Airbus, “a indústria aeronáutica tornou-se mais conhecedora das características específicas das baterias de lítio e os riscos associados podem hoje ser mitigados. Foram desenvolvidos procedimentos para a gestão destes riscos, desde o desenho da aeronave, na gestão das mesmas enquanto elementos carry-on nas cabines, ou para o seu transporte como carga. Uma consciencialização por parte dos profissionais afetos às companhias e passageiros é fulcral.” In Safety First Airbus
p.14 O artigo refere que, nos anos iniciais das investigações a este tipo específico de incidentes, entre os fatores causais encontravam-se falhas de conceção que possibilitavam curto- -circuitos internos, manufatura, integração de componentes e casing. Ainda assim, estes eram menos frequentes quando comparados com fatores humanos, nomeadamente o apelidado uso abusivo, que incluía negligência, incumprimento das instruções técnicas e danos físicos. Os últimos 10 anos testemunharam esforços no sentido de sensibilizar o público para os riscos inerentes, numa lógica de responsabilidade mútua, sendo que os princípios abaixo ainda se aplicam genericamente às aeronaves de passageiros: • Cumprimento das regras sobre que itens podem ou não ser transportados na cabine; • Aquisição de baterias apenas de fontes credíveis e que cumpram com os standards de segurança; • Na bagagem de mão, transportar apenas equipamentos eletrónicos pessoais com baterias built-in; • Proteger as baterias de curtos-circuitos e danos acidentais (por exemplo, manter os equipamentos afastados de mecanismos que possam desencadear sobreaquecimento). Os requisitos internacionais e práticas recomendadas também incluem o número de elementos (PED ou baterias) por passageiro / tripulante para uso pessoal. Normalmente, para aqueles que fiquem abaixo dos 100Watt/ hora não existe limitação (para baterias não recarregáveis; existe, porém, uma limitação que se cifra num peso total de lítio não superior a 2gr). Baterias com maior capacidade estão limitadas a uma built-in e duas sobresselentes, limitado para utilização profissional e possivelmente sujeitas a aprovação prévia pela companhia ou agente de segurança. Definições As seguintes definições explicam termos comuns às campanhas de sensibilização da IATA e da FSF – Flight Safety Foundation: • Bagagem inteligente — malas e outro tipo de bagagens que podem conter uma bateria recarregável de lítio que alimenta funcionalidades embutidas, tais como fechos eletrónicos, etiquetas eletrónicas, power banks, rodas elétricas, sistemas de pesagem, rastreadores satélite com ou sem conetividade GSM e Bluetooth, RFID; • Power banks — estes dispositivos visam o carregamento de equipamentos portáteis. A IATA determina que “Para o transporte por passageiros, estes são considerados como baterias suplentes e devem ser protegidos individualmente de curto-circuitos e transportados apenas na bagagem de cabine.”; • Trackers — estes equipamentos utilizam tecnologia de posicionamento de base satélite para a determinação da posição da bagagem associada, e também podem incluir uma funcionalidade em que a bagagem se desloca autonomamente até ao proprietário. As considerações de segurança definem que as companhias devem aprovar cada equipamento de forma prévia, por forma a evitar interferência com os sistemas de navegação, e o tracker deve permanecer desligado durante a operação de voo. Caso as baterias sejam removidas do equipamento, as mesmas devem ser protegidas e acondicionadas como qualquer outra bateria suplente; • Etiquetas eletrónicas de bagagem — tipicamente são alimentadas por baterias não-lítio, ficando assim excluídas das restrições impostas ao segmento de lítio. No entanto, para aquelas que usam baterias deste material, aplicam-se as regras definidas para PED; • Scooters elétricas — Estes equipamentos de transporte pessoal e uso recreativo estão restringidos a baterias que não excedam as 160 Watt/hora.
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.15 Bagagens Inteligentes No seguimento da campanha comercial que incitava a utilização deste tipo de equipamentos, a ICAO emitiu recomendações dirigidas aos Estados, companhias e passageiros, que explicavam as necessidades específicas relativamente à utilização destes equipamentos a bordo. A campanha também recordava que PED com baterias de lítio deveriam ser sempre transportados na bagagem de mão, completamente desligados e acondicionados por forma a não estarem em contacto com itens inflamáveis, como aerossóis ou perfumes. Alterações nas instruções técnicas da ICAO para o transporte seguro de bens por via aérea para 2019/2020 chamaram a atenção para aspetos relevantes que podem ocorrer e que afetam as determinações referentes ao tipo de baterias de que estamos a falar. Incluem: • Estabelecimento de novos critérios de classificação para baterias de lítio contendo células primárias deste material e células recarregáveis de iões de lítio; • Uma revisão proibindo o transporte de baterias que não puderam ser diagnosticadas como danificadas antes do momento de transporte; • Inclusão de novas regras que possibilitam o transporte destas baterias sob condições específicas; • Revisão dos critérios de classificação e restrições nos conteúdos de lítio para metal e capacidade total para baterias de iões contento lítio metálico primário e células de iões recarregáveis; • Novas regras para veículos elétricos; • Revisão das disposições referentes às permissões para passageiros e tripulantes no que concerne ao transporte de itens considerados perigosos; • Inclusão de novas restrições para cigarros eletrónicos; • Revisão dos requerimentos de treino para o staff das companhias. Acidentes e Incidentes A320, vicinity New York JFK NY USA, 2007 A320, nas proximidades do aeroporto JFK, NY, 2007 A 10 de Fevereiro de 2007, foi observado fumo a sair de um dos compartimentos de bagagem de cabine num avião que tinha acabado de descolar de JFK. O evento foi gerido com sucesso pela tripulação, tendo sido declarada emergência com consequente regresso ao aeroporto. A investigação subsequente atribuiu o incêndio a um curto-circuito de origem desconhecida numa das baterias suplementares de uma máquina fotográfica. B738, en-route, Colorado Springs CO USA, 2006 B738, em rota, Colorado Springs, 2006 Um B738 diverge para Colorado Springs na sequência de um incêndio em voo. Este tem início após um aparelho de purificação de ar de um passageiro se ter incendiado em voo. O utilizador sofreu queimaduras ligeiras e a cabine danos menores. . FONTES: https://skybrary.aero/articles/risk-spare-lithium-batteries https://www.iata.org/contentassets/05e6d8742b0047259bf3a700bc9d42b9/lithium_battery_risk_assessment_guidance_for_operators.pdf https://safetyfirst.airbus.com/lithium-batteries-safe-to-fly/ Damage to cabin overhead compartment video camera Hull loss Battery fire
p.16 A elaboração de um relatório para avaliar as condições de pista (Runway Condition Report - RCR) foi uma das mudanças que surgiu na sequência de uma imposição da Agência da União Europeia para a Segurança da Aviação (EASA). O procedimento anterior consistia na observação visual pelo CTA e reportes dos pilotos que posteriormente eram incluídos no ATIS, enquanto no procedimento actual, o RCR surge através de uma análise por pessoal qualificado, quando as condições de pista assim o exigem (usando um formato uniformizado da ICAO). Como este procedimento coincidiu com uma fase de menos tráfego e de pouca precipitação, é incerto o verdadeiro impacto nos atrasos e na complexidade da operação fruto das inspeções extras à pista, nomeadamente em dias com elevada ocupação da mesma que necessitem de uma actualização do RCR em curtos intervalos de tempo. Por Cá Tiago Canto Este artigo surge como objectivo de partilhar com a comunidade aeronáutica as alterações que têm acontecido nos últimos anos no Aeroporto de Lisboa, fazendo umbalanço das mudanças ocorridas e do seu impacto na operação. to de espera situado no caminho de rolagem U4 para a pista 21. Todavia, um ponto negativo é o caminho preferencial de saída de pista, que na 03 se encontra mais longe da soleira do que na 21: os respectivos taxiways, H4 e H1, situam-se a 1790 / 1600 metros de distância da soleira. Uma das últimas alterações no aeródromo foi exactamente a construção do H1, um caminho de saída rápida (Rapid Exit Taxiway – RET) da pista 21, que se situa a 1600 metros da soleira, e para o qual as aeronaves devem planear a sua saída quando a pista 21 está em uso. O H1 tem-se revelado benéfico entre duas chegadas, pois facilita a saída do tráfego da pista, dando mais margem de manobra para a operação. Relativamente ao cenário que contempla chegadas e descolagens intercaladas, o H1 tem possibilitado dar as autorizações de descolagem mais cedo, no entanto, quando a aeronave para descolar alinha pelo taxiway U5 A pista 03 dispõe agora de procedimentos de baixa visibilidade (LVP), permitindo que o aeródromo consiga operar em qualquer condição meteorológica, embora com mínimos diferentes para a implementação da operação de baixa visibilidade (LVO) em cada pista. A implementação do LVO para a pista 03 significa que deixa de ser necessário haver uma mudança de pista sempre que existam condições para tal, tornando a operação mais fluida, dado que uma mudança de pista envolve sempre maior coordenação entre diversos sectores, nomeadamente entre a Torre e a Aproximação, obrigando a, entre outros procedimentos, alterações de SIDs/STARs. Outros aspectos benéficos do LVO para a pista 03 são a ausência da necessidade do cruzamento de pista e a localização dos pontos de espera CAT II/III, que permitem ao tráfego alinhar mais cedo, em comparação com o do ponA Metamorfose do Aeroporto de Lisboa
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.17 (intersecção situada a 1295 metros do início da pista 21), não se traduz num benefício tão significativo para a operação, porque a aeronave ainda está a alinhar quando a que aterrou livra a pista, em comparação com uma aeronave que entra na pista pelo S4, caso em que já está alinhada quando a pista está livre. Outra alteração significativa na operação foi o fecho da pista 17/35. Embora a sua existência fosse uma mais-valia, dado que a sua utilização permitia aproximações mais estáveis para as aeronaves em condições de vento noroeste, no entanto a sua utilização trazia outros aspectos negativos, como alguns atrasos no chão e mais cruzamentos de pista. O seu fecho contribuiu para uma maior segurança da operação através de uma operação mais padronizada, permitindo simultaneamente estabelecer zonas de parqueamento temporário de aeronaves em caso de necessidade. Houve também uma renomeação dos caminhos de circulação, intersecções e posições de descolagem. A antiga pista 17/35 passou a ser o taxiway Tango e os antigos S1 e S2 passaram a ser designados A6 e A7, respectivamente, de modo a evitar possíveis confusões dos pilotos com o ponto de espera para descolagem S4. Esta alteração surgiu após uma recomendação feita pela Agência de Investigação de Acidentes Aéreos do Reino Unido (AAIB UK – EW/C2019/09/03), na sequência de incidentes graves devido a erros no cálculo da distância para descolagem. A carta de hotspots, já com 12 anos de existência, foi actualizada em Dezembro de 2021. Nesta estão assinaladas as zonas do aeródromo com potencial risco de colisão ou de incursão de pista, alertando as tripulações e condutores de veículos para a necessidade de uma atenção acrescida nestas zonas, de forma a garantir uma maior segurança da operação. Por fim, carecem ainda de confirmação, por parte da ANA Aeroportos, as seguintes alterações para o futuro: • Expansão da placa 10, através da construção de mais stands com manga, que chegarão até à placa 22 por meio de uma reconversão da zona; • Elaborar um RCR a cada revista programada à pista, permitindo ter a informação mais actualizada; • Abertura da RET H2 (pista 03). Na avaliação de segurança, a NAV considerou que não estavam assegurados os mínimos para uma operação segura, nomeadamente no caso de chegadas consecutivas. A alternativa passa por contruir um taxiway paralelo ao Uniform, que está pendente da mudança do quartel dos bombeiros e das negociações com o AT1; • Construção de um ponto de espera a norte do U5, que seria alimentado por um taxiway paralelo ao Uniform, e que permitiria a existência de dois pontos de espera do lado nascente da pista 21 e mais um ponto de cruzamento de pista, este mais perto da zona de toque da pista 21, o que significaria um cruzamento da mesma mais cedo do que atualmente; • Construção de uma nova Torre (prevista para 2027), dado que a actual não dispõe de uma estrutura que permita a implementação do sistema TopSKY Tower; • Alteração da designação da pista 03/21 para 02/20. Os trabalhos deverão começar a 4 de Abril e terminar a 19 de Maio de 2022 (AIRAC AIP SUP 002/2022). . AIP PORTUGAL LPPT AD 2.24.01 - 1 © NAV Portugal, E.P.E. 02-DEC-2021 AIRAC 005-21 02-DEC-2021 RWY 17/35 withdrawn. New TWY.
p.18 Por Cá Fernando Fernandes Fotos: Nuno Chambel Após uma análise ergonómica crítica aos postos de trabalho da SOP, foram identificadas situações que necessariamente teriam de ser corrigidas aquando da conceção das novas bancadas para a NSO. Com a recente experiência na memória, a metodologia passaria por fazer transitar os aspetos positivos e retificar os menos bem conseguidos da SOP. Com o necessário feedback dos operacionais, foram tidas em conta as experiências do ponto de vista do utilizador, de modo a que as novas posições de trabalho obedecessem a uma interpretação ergonómica, propiciando locais de trabalho mais confortáveis e saudáveis. Nova Sala de Operações no Centro de Controlo de Lisboa Depois de dois anos na SOP, em que criamos o hábito de trabalharmos na exiguidade espacial, com os seus prós e contras, a mudança para o espaço amplo da NSO poderá criar uma certa resistência inicial, sentimento que se entende de natural, pois a amplitude do espaço é de uma ordem francamente superior. A qualidade do posto de trabalho individual será superior, não existindo a proximidade excessiva de outras posições, minimizando o ruído gerado pelas várias estações contíguas. No entanto, por sermos criaturas sociais por excelência, a proximidade dos colegas fomentava um sentimento de grupo que é próprio da condição humana, emprestando um certo conforto emocional ao local de trabalho. E não podemos ignorar esse aspeto. 14 de janeiro de 2020. Enquanto se celebrava a transição bem-sucedida para a Sala de Operações Provisória (SOP), outra empresa tomava forma e iria desafiar os seus proponentes durante os próximos dois anos: idealizar, conceber e produzir a Nova Sala de Operações (NSO).
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.19 O que realmente mudou? Depois de um hall de entrada com acesso restrito, abre-se uma escadaria do lado esquerdo que dá acesso a um mini lounge, equipado com máquina de café e chá, próprio para quem tem um intervalo pequeno ou tenha tido, p.ex., dispensa do Chefe de Sala da posição de Apoio. Com uma vista sobranceira a toda a NSO, é o local indicado para os visitantes usufruírem de uma ampla visão sobre a mesma. No seguimento desta sala, abre-se um espaço de reuniões, próprio de quem recebe entidades externas, e com as valências necessárias para tal efeito. Tal como a sala anterior, possui uma invejável panorâmica para a NSO. Para além das estações de trabalho, unidades nucleares de qualquer sala de operações de controlo de tráfego aéreo, outros aspetos fundamentais, tal como a luz ou a disposição das posições, assumiram papéis fundamentais aquando da criação dos espaços. Há que controlar a entrada de luz natural, imprescindível para o bem-estar das pessoas, mas que pode ter efeitos perniciosos nos écrans, produzindo indesejáveis reflexos. Em sintonia com as várias zonas de luz artificial, é possível a criação de múltiplos espaços com características luminosas distintas, exibindo dois tipos de temperatura de luz, tendo ambas uma regulação entre os 0 e os 100%. Desta forma é possível apresentar, consoante a área pretendida, temperaturas de luz diferenciadas, reguladas com a intensidade desejada, tudo controlado a partir de uma unidade central através de um programa de leitura fácil e intuitiva. No meio de tantas possibilidades, apenas falta chegar a um consenso que agrade aos utilizadores de cada zona! Conforme referido no início, importava fazer transitar o modelo anterior, mantendo as suas características de forma e disposição funcional, de forma a que o stress da mudança fosse apaziguado para o utilizador. E, ao mesmo tempo, eliminar as particularidades menos bem conseguidas (como o “fosso” de arrumação entre o utilizador e o VCS), respeitando as distâncias tidas como ideais, privilegiando a zona primária de trabalho (QPV e depois rato/ teclado no TOPSKY), zona secundária (VCS) e distância ao écran. Foi importante relembrar que uma posição de trabalho ergonómica começa na forma como nos sentamos: essa é a base para que não tenhamos vícios de postura e não nos venhamos, no futuro, a queixar de pequenas mazelas associadas a posturas menos aconselhadas. Agora que já exibimos uma postura correta enquanto sentados, está na hora do acerto da bancada! A regulação da bancada em altura permite a cada um encontrar a sua posição ideal, adequando a mesma à altura da cadeira, acedendo à zona primária de trabalho sem esforço para com as articulações das mãos e dos braços. Finda esta afinação, segue-se a regulação da altura do écran. O centro do mesmo deverá ficar ligeiramente abaixo do nível dos olhos, para que a pressão na zona do pescoço seja reduzida, promovendo uma postura natural e confortável. No limite da regulação, as posições possibilitarão que se possa trabalhar em pé, incentivando uma agradável alternativa à clássica posição, estimulando os fluxos sanguíneos e combatendo a inércia da posição sentada, hábito saudável quando o tráfego é menor, como é o caso dos turnos da noite ou outros períodos de menor afluência. Numa fase inicial ainda teremos o ónus das fitas de progresso de voo, condição que se prevê temporária e que antecipamos que termine com a entrada em operação do sistema TopSKY, em setembro do corrente ano. Após esta transição, disporemos de uma posição adequada ao uso de teclado e rato, ajustável em dois níveis de altura (bancada e écran), numa sala com outro apelo estético e commúltiplas regulações de luminosidade. Depois de uma transição bem-sucedida, iniciada com a passagem do controlo de aproximação no dia 6 de março, pelas 2200 horas, e terminada com a transição dos setores de rota “do mar” (Setores Oeste e Madeira) no dia 11 de março, resta-nos usufruir dum espaço mais moderno, agradável e mais consentâneo com a importante missão que é o controlo de tráfego aéreo. Que esta sala seja sinónimo de esperança e boa fortuna para todos os operacionais do Centro de Controlo de Lisboa! .
p.20 Lado Técnico Pedro Carvalho 5G: Transmitting blind O espectro RF Desde o tempo das primeiras transmissões rádio à distância do Sr. Marconi (final do século XIX) que temos tido cada vez mais equipamentos de radiofrequência (RF) que concorrem por lugar no espectro hertziano disponível. Para concertar e recomendar a distribuição do espectro a determinadas tecnologias foi criada a ITU (International Telecommunication Union) que está dividida em secções geográficas administrativas aproximadamente iguais à área que alocamos a cada continente. No caso dos Estados Unidos da América a entidade reguladora das comunicações que dialoga com a ITU denomina-se FCC (Federal Communications Comission) e é análoga à nossa ANACOM. A FCC tem carácter regulador no território norte-americano e é a responsável pela alocação do espectro às operadoras móveis, bem como aos demais utilizadores, como os prestadores de serviços de tráfego aéreo (frequências para as comunicações VHF, frequências para as emissões de ILS, VOR, NDB…) ou equipamentos emissores de aeronaves. O inexorável avanço tecnológico trouxe-nos uma nova versão para as comunicações móveis sem fios denominada 5G. À semelhança das quatro anteriores, os ganhos são substanciais a nível de rapidez e latência de sinal, prometendo uma nova era nas nossas vidas online. A designação de 5G consubstancia-se num conjunto de protocolos de engenharia que regulamas regras técnicas de transmissão, recepção e processamento dos dados da rede móvel. Este conceito temposteriormente de ser implementado no terreno em soluções concretas. E é aqui que começa o problema que nos traz a este artigo…
REVISTA APCTA. VOL4 #59. ABR22 Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo p.21 Com o crescimento do número de tecnologias móveis disponíveis foi-se começando a notar uma procura cada vez maior por uma determinada região do espectro de frequências denominado de banda intermédia (mid-band, também conhecida como C-Band). Estas frequências intermédias têm características ideais de propagação compatíveis com as necessidades do 5G que as tornam desejáveis pelas operadoras móveis. É também aqui que se encontra a banda de frequências alocada aos rádio-altímetros comuns nas aeronaves. Na figura 1 encontra-se a distribuição do espectro anterior à chegada do 5G. OS rádio-altímetros aeronáuticos foram construídos desde os anos 60 de acordo com as recomendações ITU na banda dos 4,2 a 4,4 GHz. As frequências imediatamente inferiores a 4,2 GHz estavam alocadas a comunicações de satélite que são, por natureza, comunicações com baixos valores de energia radiada (potências baixas), e esparsas geograficamente. As frequências imediatamente acima dos 4,4 GHz estavam alocadas a serviços técnicos das redes das operadoras de telecomunicações (por exemplo dados de diagnóstico de rede) e novamente a comunicações de satélite. Nenhum destes “vizinhos” dos rádio-altímetros apresentava potencial de interferência sistémica às aeronaves. Possuíam potências de emissão muito baixas e eram utilizados pontualmente na superfície terrestre. Na figura 2 apresenta-se uma comparação entre os espectros mid-band pré-5G e pós-5G, realçando a capacidade típica de filtragem de sinais indesejáveis pelos sistemas dos rádio- -altímetros. Como lidar com o problema Após as primeiras reuniões técnicas sobre a implementação do 5G nas frequências mid-band, tornou-se evidente que algo teria de ser feito para evitar o problema das interferências do sinal 5G nos sistemas das aeronaves. Existiam várias possibilidades de lidar com o problema que foram exploradas: • Melhorar a capacidade de filtragem dos rádio-altímetros embarcados de modo a rejeitarem os sinais das bandas adjacentes: Esta solução apresenta várias dificuldades de implementação e não agrada à indústria aeronáutica. Existem milhares de aeronaves já construídas com rádio-altímetros embarcados que obedecem a especificações técnicas revistas pela última vez em 1980. Nessa data não existia o congestionamento do espectro de radiofrequência actual e os critérios de filtragem não eram compatíveis com o que se pretende implementar agora. A alternativa consiste em substituir todos os rádio-altímetros incompatíveis por novas versões. Os custos associados são elevadíssimos e existe a violação dum princípio histórico da ITU que consiste na deferência das novas tecnologias pelas já existentes, ou seja: devem ser as novas tecnologias a compatibilizar-se com o espectro RF já existente, e não o contrário. • Implementar o 5G noutras frequências dis- tintas do mid-band: Esta solução não agrada às operadoras móveis. A tecnologia 5G é teoricamente independente da frequência a que opera o sinal rádio. Mas também não lhe é indiferente. No espectro mid-band é possível obter características técnicas de propagação compatíveis com uma exploração económica da rede móvel. Isto traduz-se no número de antenas que a operadora tem de instalar no terreno para garantir cobertura adequada Figura 1- Alocação do espectro mid-band, ITU 2020 Figura 2 - Alteração do espectro mid-band vs. rejeição de interferências dos rádio-altímetros
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